Arraiais, Finalistas e Cartolas
Final de ano a aproximar-se e as preocupações mudam, substancialmente.
As prioridades mudaram de um momento para o outro, e o
discurso parece ter mudado um pouco. Ou seja, passámos um ano letivo a defender
os diretos das crianças, a valorizar o SER criança, mas tornamos este final de
ano num verdadeiro terror de peças de teatro, canções, danças, e afins, tudo
para que os arraiais aconteçam e as crianças sejam, mais uma vez, o foco de
atenção. No entanto, para serem esse foco passaram semanas a ensaiar algo que nunca
tinham feito, algo que não reflete o ano que passaram, mas vale tudo!
Lá começam as febres das festas de final de ano, associadas
às festas de Finalistas…. E mesmo sabendo que a maioria ira transitar de ciclo,
ou de etapas, falando na creche e na educação pré-escolar, cada mudança leva a
uma festa de finalistas… à construção de cartolas reluzentes e brilhantes, que acabada
a festa tem o seu destino marcado: lixo. É um tempo gasto em prol de um
embelezamento que as próprias crianças não entendem. Tradições que foram
surgindo de um modo pouco refletido.
A que sujeitamos os miúdos nestes momentos?
Que intencionalidade imprimimos nas festas de Final de Ano,
nas festas de Finalistas?
Passadas algumas semanas de ensaios, há crianças que já não
podem ouvir as canções, que já não suportam as danças, que já nem querem ouvir
a palavra finalistas, tal é a pressão que lhes é colocada em cima. Mas o
importante é marcar estes momentos, o foco mudou e ninguém tenta perceber como
se sentem ou o que emoções lhes causa. O importante é que as atuações corram
bem, que o stress que os professores sentem e é transmitido, naturalmente, para
os alunos, seja minimizado, que o stress que se causa aos miúdos seja no fim
valorizado pelas palmas de quem espera pacientemente sentado numa cadeira.
As estrelas atuam e, mesmo em tom de obrigatoriedade,
sorriem envergonhados em ser entenderem porque o estão a fazer. Diz-se, vão
mudar de escola e por isso, são apelidados de finalistas. Não basta já o
sentimento que têm para essa mudança, ainda os sujeitamos a momentos em que a
ansiedade aumenta.
Acontecem as birras, as recusas para a atuação, porque,
simplesmente, não soubemos tornar este momento numa escuta das crianças e,
muito menos, o tornámos um reflexo do que foi o ano letivo.
Comecemos a criar espaços realmente interessantes para
todos, em que o principal não são os diplomas, ou as marchas, ou as canções, … mas
todo o percurso do ano, refletido realmente, em dinâmicas que o valorizam e que
não o ridicularizam numa canção, lengalenga ou dança, ou aquilo que se
lembrarem.
Seremos capazes de fazer mais e melhor?
De facto, as festas de final de ano assumem um grande
momento. Comemorar o fim do ano letivo é, realmente, festejar o fim de uma
etapa, mas que seja o reflexo real dessas vivências e das experimentações do
grupo e das crianças.
Tenhamos a capacidade de refletir, o stress que nós próprios
vivemos, na preocupação, excessiva, para o modo como irá correr, na construção
de cenários, coreografias, … faz com que a pressão que lhes colocamos em cima
seja elevada, alterando o estado emocional que eles próprios assumem. O que
transmitimos? Mostramos que, os breves 2 minutos, ou 3 minutos, tornar-se-ão
tão importantes, que, aparentemente, são esses minutos que refletem a nossa
prática de milhares de minutos… é isso que estamos a dizer.
Mas não. Criem espaços que reflitam de facto o festejo do
final de ano, onde refletem o verdeiro percurso vivido, a verdadeira essência
do ano e, principalmente, permitam que as crianças se continuem a divertir. Não
tornemos estas festas de finalistas e de final de ano o terror das crianças, em
que se obrigam a comportamentos completamente desnecessários.
Teremos de tornar estes momentos como um espelho de práticas
e não como um espetáculo da Broadway, porque aqueles que devem ser enaltecidos,
aqueles que devem ser valorizados e respeitados, são as crianças, é a eles que
teremos de agradar ou, pelo menos, tornar claro o seu esforço.
Viver as festas de final de ano é, realmente um espaço em
que as comunidades se juntam, em que os intervenientes participam, mas
considera-se que o mesmo é, também, e deverá ser um espaço intencional e
pedagógico.
As pupurinas substituem os desenhos. As cartolas subestimam
todo o esforço e centram-se simplesmente no resultado. As danças de última hora
esquecem as sessões de educação física. Criem-se exposições, que dão trabalho a
montar e a justificar, mas que refletem o que foi feito. Criem-se espaço que
tornem evidente o que não é visível.
Tenhamos a consciência de que o termo finalista implica uma
sobrevalorização. Pensar neste termo é pensar que haverá mudança, é pensar que,
o tempo gasto pelos educadores e professores nestas organizações, deveria ser
gasto sim, de um modo mais sério na forma como se pensam as transições. Esse
sim, um momento que carece de muita atenção e cuidado.
Premiar as crianças com um momento que, aparentemente é de
festa para os adultos, não é uma recompensa.
A valorização de chegada ao final de etapas passa,
essencialmente, por se valorizar o crescimento, e, como tal, o envolvimento das
crianças nestes processos é fundamental, tal como é e foi ao longo ano. Não
mudemos a nossa forma de olhar de olhar para as crianças porque a festa de
final de ano se aproxima, porque a festa dos finalistas está logo ali….
Acima de tudo, que se torne consciente o porquê deste tipo
de comemorações, que se torne consciente a forma como se criam e se realizam.
E por fim, que se torne consciente a quem se dirigem: é uma
festa para as crianças, ou para os pais?
#umacaixacheiadenada
Rui Inácio
Se gostou, poderá ler: Venham de lá os arraiais, a costura e os dedais!
Muito bem...
ResponderEliminarMuito bem. Adorei tudo o que está escrito. O que importa mesmo é a felicidade das crianças. 👏👏👏
ResponderEliminarMuito bem😊 é tão verdade, o principal é a felicidade e simplicidade dos nosso meninos e não os "maravilhosos" espectáculos transmitidos na fita festa 🙄
ResponderEliminarObrigado educador