Sabes mãe, fui à praia, estava bandeira verde e só me deixaram molhar a ponta dos pés


O tempo está encoberto, aqueles que continuam na escola, fazem praia. Em círculo estão sentados na toalha, a aguardar as ordens dos adultos para que se possam levantar e, assim, possam fazer o que melhor sabem, brincar.

Brincam dentro do círculo, desenhado com toalhas de forma rigorosa.

A bandeira está verde e,  code acordo com a canção, "bandeira verde, podes nadar"... 



Chega a hora desejada do banho. Os adultos chamam os mais pequenos, alertando-os para que tudo fique arrumado e assim, possam ir nadar.

Dois a dois, começam a formar o comboio em direção ao mar. Um adulto segue à frente, outro no meio e no fim do comboio, segue mais um.

Em passo lento caminham até ao sítio onde se irão banhar. O mar está mesmo à sua frente e a vontade de ir a correr para dentro do mar é enorme. 



Estão-se a aproximar, o coração pula de tal forma, que sorriem de uma forma incrível, aquele momento pelo qual tanto esperam aproxima-se, mesmo!

Estão a uns meros 2 metros do mar e estão preparados para... "Meninos, podem-se sentar em fila e já vamos tomar banho ao mar"

Antes em comboio, controlado, agora, sentados em fila, observam o mar, na ânsia de que a sua vez chegue para tomarem o dito banho.

O nadador salvador levanta-se do seu posto, e acompanha o grupo, imaginando que todos estarão na água a aproveitar aquele momento. E que, deverá manter-se junto a todos eles para auxiliar tão difícil tarefa: estrelas com um grupo de cerca de 20 crianças na água.

Dois adultos chamam aqueles pequenos seres ansiosos, chamam dois a dois, e de mão dada, dirigem-se  para a água, para se possam molhar e aproveitar o mar calmo.
Encaminham-se para a água,  puxam a mão dos adultos para que se apressem, e de forma forçada, fazem os mais pequenos recuar e acalmar a excitação.

A pequena onda aproxima-se, bate de leve na areia e estende-se poucos centímetros até chegar aos pés dos pequenos. Molham os pés, porque não é permitido mais. São cerca de 60 segundos a aproveitar aquela água fresca nos pés. Quando acham que se vão molhar mais, há quem que diga "já molhaste os pés, agora vamos para o pé dos amigos, para que venham outros meninos molhar os pés".

O momento que era de excitação, de um interesse extremo em explorar aquela água e brincar com ela, torna-se um momento curto, em que o seu envolvimento desce em pique. 


De costas voltadas para o mar, seguem agora para a fila que está sentada a ver os colegas a molhar os pés.

Dois a dois, molharam-se,... molharam os pés, e voltaram para o seu lugar cheios de frustração, por apenas terem molhado os seus pés... Mesmo estando bandeira verde.

Estão novamente cercados por toalhas, a brincar com o que lhes é permitido.

O nadador salvador, regressa ao seu posto, descansado, pois não teve de dar apoio naquele momento. Não deu, porque não foi necessário, porque apenas 4 crianças molhavam os pés, de mãos dadas, enquanto os restantes os observavam. E ele, com a boia às costas, manteve-se atento e disponível para permitir que todos eles se banhassem.

Ao final do dia, e depois de um dia cansativo de banhos, chegam a casa e dizem: "Sabes mãe, hoje fui à praia, estava bandeira verde e só me deixaram molhar a ponta dos pés."

#umacaixacheiadenada

Rui Inácio




Comentários

  1. olha... que triste realidade, embora compreenda a dificuldade dos educadores levarem tantos agua... perfiro sozinha levar o Gabriel para as ondas como ele gosta ;)

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    1. Não se pode fazer com 20, o que se faz com 1 ou 2 crianças.Uma pequena distração e uma criança pode se afogar , mesmo com bandeira verde! Ninguem quer ter o peso de sequer pensar em tal tragédia.Por isso compreendo as precaução. Banhos demorados e relaxados têm que ser feitos em família! É demasiada responsabilidade ir a banhos vom crianças.

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    2. Obrigado pelos vossos comentários! De facto a responsabilidade é algo acrescido, algo que nos leva a agir com precaução. O texto, mais uma vez, pretende fazer pensar nas ações que acabamos por ter. Apesar de ser um momento de extrema responsabilidade, acredito que se torna importa te apostar no trabalho prévio com os miúdos. E sim, os olhos que temos, acabam por ser poucos para as crianças que levamos. Obrigado

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    3. Que exagero!!! Não é assim que as coisas funcionam.

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    4. Pois... É uma reflexão infelizmente, vê-se este funcionamento de forma constante. Não é assim tão estranho de acontecer. Mas como lhe disse é uma reflexão.

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  2. E os adultos vao para casa, com a sensacao de tarefa cumprida e que as criancas foram a praia e por isso tiveram um dia fantastico... esquecendo-se do mais importante, deixaram-nas ser criancas? Parabens pelo texto e pela sua forma de pensar!

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    1. Obrigado Ana. Com o texto apenas pretendo provocar à reflexão, apenas pretendo que se reflita no "porque fazemos o que fazemos". De acordo com os comentários que foram surgindo, torna-se evidente o medo que existe neste momento. É de facto um momento de uma responsabilidade enorme, mas defendo a prevenção,ou seja, o trabalho prévio. Mas o medo continua a ser algo que nos leva a não agir de acordo com os interesses das crianças. Não se apontam dedos, mais uma vez digo, reflita-se! Obrigado pelo seu comentário

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  3. Claramente nao e educador de infancia e nem lhe passa pela cabeça a responsabilidade que e levar os filhos dos outros a praia...
    Sou educadora e ja fui muitas vezes a praia com diversos grupos ao longo dos anos e, embora nao tivesse regras tao rigidas como acima descritas (na minha opiniao bastante exageradas ou vistas por olhos que nao compreendem o que estao a ver), compreendo totalmente essas precauçoes!!!
    Toda a gente tem direito a sua opiniao obviamente mas lamento nao se ter colocado um pouco na posiçao desses profissionais...
    (lamento tambem a falta de pontuaçao)

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    1. O problema não são os educadores, mas os pais que deixam os filhos com tais...

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    2. Em primeiro lugar gostaria de agradecer à colega o seu comentário. Escrevi colega, de facto sim, escrevi. Apenas por uma razão, sim, sou educador, sim, estou consciente da responsabilidade que é levar crianças à praia. Sim, compreendo o que vejo, porque mais uma vez lhe digo: sou educador. Ao escrever o texto, assim como os restantes, pretendo apenas criar momentos de reflexão, levando a que possamos, a quem tiver essa capacidade, de refletir na máxima "porque fazemos o que fazemos". São práticas que cada um prática consoante o que acredita, consoante a sua forma de estar, consoante a confiança que tem. Não se aponto culpados, não se dizem que estão erradas... Mais uma vez refiro são textos para promover a discussão, a reflexão conjunta. Como tal, agradeço a sua intervenção, e mesmo sendo educador, sei me colocar do lado dos profissionais, porque eu também faço praia com os miúdos. Agradeço de forma sincera as suas palavras. O EDUCADOR Rui

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    3. Eu sou educadora e levei muuuuuuitos meninos a banhos este verão. quando estava bandeira verde fiz barreira com as minhas colegas e o nadador salvador foi requerido para estar por perto em caso de necessidade. quando a bandeira estava vermelha, se fizesse aquelas poças a meio da areia, já LONGE das ondas podiam chapinhar lá à vontade. quando amarela, podiam só molhar os pés, duas crianças para um adulto como disse no texto acima.
      Nunca fiz círculos de toalhas, cada um pousa a toalha onde quer dentro da zona em que estamos (combinada verbalmente e não sinalizada fisicamente)... mas isso digo eu, que estou numa praia tranquila (Santa Rita - Maceira) sem muita confusão e onde os grupos que se juntam na praia se distinguem pelo chapéu (cada grupo uma cor) esse sim religiosamente colocado na cabeça (porque a mania da contagem não nos larga e a responsabilidade assim o exige).
      Obrigada Rui, por mais um excelente texto de reflexão e inspiração

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  4. Fiz praia mais de 35 anos , sempre responsável por um grupo de 22/25 crianças com apoio de 1 ou 2 auxiliares dependendo da idade do grupo. A ida à praia , banho incluído foi sempre um prazer para mim e para as crianças . Para promover a máxima segurança mas também a exploração do espaço e o divertimento tínhamos algumas medidas tais como fazer a época balnear de 15 a 30 de Junho na praia da Torre , ir ao banho no local onde estivessem menos grupos... mas íamos sempre à água duas vezes e com água suficiente para mergulhar e tomarem todos banho brincando e usufruindo da companhia do grupo. Se as crianças não puderem brincar , usufruir, experimentar, não me parece que faça muito sentido a ida à praia ��

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  5. Ola!
    Sou educadora e já levei vários grupos à praia. Sim, fazemos círculos na areia, por questão de organização e segurança...mas na hora do banho e com bandeira verde vamos mesmo para dentro de água (quem não quer fica à beirinha a brincar livremente) e molhamo-nos dos pés à cabeça, mesmo com a água às vezes gelada. Se tenho receio? Claro que sim...estão baixo a minha responsabilidade mas jamais os levaria só a molhar os pés (só em caso de bandeira vermelha). É tão bom brincar na areia e na água...acaso não gostávamos quando tínhamos a idade deles? Sempre que houver adultos suficientes, nadadores salvadores por perto e boa vontade, eles irão com certeza disfrutar desse momento!

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  6. Educador e mentor de mais um espaço de partilhas e de diálogo. Parabéns por isso Educador Rui.
    O que mais importa:
    ... é darmos asas e vida às nossas crianças;
    ... é trabalharmos com elas desde cedo para que possam viver;
    ...é sabermos fazer escolhas, ter estratégias, trabalhar para a prevenção;
    ...é conhecermos os adultos com quem trabalhamos;
    ...é dialogarmos com as famílias;
    Para que no final de um dia de trabalho possamos sentir que fizemos a diferença na vida da criança e da sua família.
    Sim, o coração palpita em cada viagem, em cada aventura, em cada situação de risco, mas no final vale tudo apena.

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  7. Os papás é que devem levar os seus filhos à praia. Texto brilhante, mas agora escreva outro a aconselhar os papás a educar os seus filhos, a partilharem tempos livres, brincar com eles e obviamente ir com eles a praia, visitar museus, dar passeios ao campo, etc

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  8. Fiz várias vezes praia com grupo de crianças ,algumas com 2 e 3 anos, nunca nenhuma criança ficou sem o seu banho, tomava-mos todo o cuidado, primeiro iam as mais velhas e depois as mais novas. Mas vi muitas crianças de outras escolas que apenas molhavam os pés, porque os responsáveis tinham medo, ora se os pais pagam e alguns com muito sacrifício, porque as crianças não podem ir tomar banho e chapinhar na água? Para que isto seja possível há que haver mais adultos a acompanhar, por exemplo pais que tenham disponibilidade, ou então fazer grupos pequenos. Quando há vontade tudo se consegue e os problemas contornam-se

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