Escutar não chega: As crianças têm o direito de participar

Escutar não chega: As crianças têm o direito de participar


Todos os dias, nos jardins de infância e nas creches, por todo o país, as crianças entram com a promessa do respeito pela sua liberdade, descoberta e muita brincadeira.

Mas ao atravessarem esses portões, nem sempre encontram um espaço onde a sua voz é, verdadeiramente, ouvida. Ou, pior, é-lhes pedido que escutem, mas que não falem, que participem, mas apenas naquilo que convém.

A Recomendação n.º 2/2021 do Conselho Nacional de Educação lança um alerta: as crianças têm o direito à participação desde os primeiros anos de vida.

Não se trata de um favor, ou, até, de uma moda pedagógica é um princípio ético, pedagógico e democrático.

A participação surge como um direito consagrado na Convenção dos Direitos da Criança e a Educação de Infância é a primeira etapa onde esse direito pode, e deve, ser exercido.

Participar é mais do que dar a opinião

Quando falamos em participação da criança, não estamos, apenas, a dizer que as crianças podem escolher a cor do papel para um cartaz ou dar a opinião sobre que história vão ouvir. Participar é conseguir envolver, é cocriar, é confiar. É permitir que as crianças pensem connosco, que ajudem a transformar os espaços, os tempos e, até, as rotinas.

É permitir que tragam ideias, dúvidas e sonhos. É permitir que nos surpreendam.

Porquê agora? Porque já estamos atrasados

A mesma recomendação denuncia o que tantos educadores já sentem no terreno, há um longo caminho a percorrer para que a participação das crianças deixe de ser uma intenção centrada no “Giro” e passe a ser uma realidade nos contextos educativos, com intenção, mas mais do que isso, com consciência.

As decisões continuam a ser tomadas para as crianças, e não com as crianças.

Este desfasamento entre o que se diz e o que se impede que as crianças desenvolvam a autonomia, o espírito crítico e o sentido de pertença.

Limita o seu direito à cidadania desde a primeira infância. E perpetua uma cultura educativa onde os adultos sabem tudo e as crianças pouco podem fazer além de seguir o que lhes é dito, e, desta forma, regressamos a uma escola transmissiva e meramente, instrutiva.

Educar é escutar. Mas também é devolver poder.

A participação não acontece por acaso. Exige tempo, escuta, sensibilidade, disponibilidade e coragem. Exige a construção de ambientes que acolham a incerteza e educadores que aceitem não ter sempre a última palavra. Exige uma mudança de paradigma, deixar de ver as crianças como objetos de intervenção e começar a reconhecê-las como sujeitos ativos, com saberes e possibilidade de ação.

E se perguntarmos às crianças:

- como se sentem no jardim de infância?

- que momentos do dia mais gostam?

- o que gostariam de mudar?

- que ideias têm para tornar o espaço (interior e exterior) mais interessante?

- o que gostavam de ver mudado na sala?

E as respostas?... escutar, sem filtros, sem pressas, sem medo de mudar o que está feito e “sempre foi assim”.

Participar é um direito, um princípio.

A participação das crianças é um direito. A participação é o que transforma a Educação de Infância num espaço, verdadeiramente, democrático, onde se aprende com os outros e sobre os outros. Um lugar onde as crianças não se desenvolvem apenas, mas crescem em sociedade, com os adultos, não em silêncio, mas em diálogo.

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