Hoje acordei e decidi, tentar, ser um bom educador.

Acordei e enquanto me despachava para ir trabalhar pensei na sorte que tenho, sou Educador de Infância. 

Acordei confiante e com o desejo de me tornar num educador melhor do que aquele sou.

Decidi que tentarei olhar para cada uma das crianças que se senta, diariamente, à minha frente, à volta da mesa e que tem tanto para me contar, mas que nem sempre tenho a disponibilidade para as escutar. Decidi desafiar-me a ser melhor, a tornar possíveis os seus interesses, a tornar as suas motivações as minhas motivações. 

Hoje acordei e decidi, simplesmente, tornar-me num profissional capaz de olhar para estes pequenos como seres capazes de definir trilhos, caminhos a percorrer, decidi investigar o termo de escuta ativa, que tantas vezes ouvi falar, mas que me passou ao lado. 

Acordei e decidi tornar cada momento na minha sala, na nossa sala, nosso. Nosso, porque vou tornar real as palavras que se ouvem e se leem tantas vezes, seguir o real interesse das crianças. Até hoje, estava adormecido e não conseguia entender o que eles tinham para me oferecer. Sempre achei que o facto de ser educador me tornaria o conhecedor, o detentor de conhecimentos prontos a serem transmitidos, mas hoje acordei, e vi que realmente, sou eu, educador, que tenho muito a aprender com eles. 

Hoje acordei e decidi deixar de parte o giro e o está bonito, e sempre que me pedirem a minha opinião tentarei justificar e desafiá-los a serem melhores e a irem mais além do sítio onde chegaram. 

Acordei e tornarei o meu dia o melhor, farei com que os abraços que me dão, as palavras que os acompanham e os gestos que os acarinham sejam para mim a motivação, a alegria e o alicerce daquilo que quero ser enquanto educador, estabelecer um relação de amizade, afeto e de confiança com os mais pequenos. 

Acordei e mesmo estando tão próximo do Natal, quero ver apenas os seus desejos a tornarem-se realidade. E, se as prendas não forem o seu desejo, não as faremos e se o cantar e o dançar em frente aos pais não for a sua ambição, não o faremos, porque há mais a mostrar do que uma canção, uma dança ou um teatro. Há um gesto puro de partilha e de alegria que além de ser vivido no Natal deve ser prolongado pelos restantes dias do ano. 

Acordei e desafiei-me a ser melhor educador, porque ao longo da minha vida profissional me incutiram regras, em que as grelhas eram palavras de ordem, em que as mesmas pretendiam uma avaliação. Dizem que desta forma tudo se tornaria percetível, tudo se tornaria possível de arquivar e compor no dossier, assim fundamentar-se-ia todo o processo de aprendizagem. Mas acordei e, com o acordar, surgiram-me tantas ideias afastadas das grelhas de avaliação, que tendem a igualar todas as crianças, que tendem a reduzir as milhares de aprendizagens que estão inerentes à brincadeira ao não adquirido, em aquisição, adquirido e ao não observado. E tudo o resto que não consta nelas? Tudo o resto que se torna mais importante do que todos os objetivos copiados meticulosamente de outras grelhas de agrupamentos, de projetos ou, porque não, da internet? Finalmente acordei e tentei acordar quem estava à minha volta. 

Hoje acordei ansioso por tentar ser um bom educador, em que a rua assume um local fabuloso de experiências, em que o chão se torna o quadro de giz, em que a relva se torna a aventura, em que as árvores se tornam o risco, em que as corridas se tornam os jogos sociais e de parcerias, em que o frio, o sol, a chuva, se tornam não impedem as explorações puras e de interesse inato nas crianças. As calças sujas tornam-se testemunhas de quedas, de derrapagens, de distrações, mas acima de tudo, de brincadeira ao lar livre. Estava, realmente, adormecido.

Hoje acordei empenhado em ser um bom educador, desafiando quem está ao meu lado a refletir em conjunto, em olharmos para a educação de infância como uma parceria e não como ilhas isoladas com linguagens distintivas e afastadas. Acordei empenhado em construir uma relação de crescimento profissional em que o importante não é o que se coloca na parede, os desenhos iguais e corrigidos pelos adultos, mas sim o reflexo de aprendizagens que são fruto do reconhecimento de que os mais pequenos são agentes ativos, imprescindíveis, da sua aprendizagem. 

Acordei e estou certo de que me tornarei um bom educador, que tocarei em 25 pequenos corações, que os levarei no meu pensamento para casa com o intuito de melhorar cada dia, desafiando-me a encontrar estratégias que respondam às questões que levantam, que construam os projetos reais e de acordo com aquilo que sentem. Eu acordei e só tenho de fazer esse esforço, olhar para eles e sentir como sentem cada palavra, cada ação, cada pergunta alucinante com direito a uma resposta mirabolante. 

Acordei e pensei em tornar-me num educador melhor do que aquele que sou. Ao invés de procurar as atividade prontas a consumir, ao invés de me socorrer do Facebook, do Pinterest, Instagram, ou de qualquer motor de busca de forma constante, consultarei o melhor motor de busca que conheço, o meu grupo, as crianças, têm solução para tudo, têm caminhos definidos para tudo, têm prática em brincar e em ultrapassar os seus erros buscando sempre a melhor forma de responder às suas questões.Têm ousadia e ensinam-me a ser persistente, a lutar pelos seus interesses.

Hoje acordei e decidi tornar-me num bom educador e em vez de colocar de forma constante a culpa na família, tenderei a compreender cada uma, fazendo com que exista uma compreensão clara do trabalho que faço e que desenvolvo, respeitando cada um e cada família, com o único objetivo, proporcionar o dia dos filhos de quem tomo conta únicos e extremamente ricos em aprendizagem.

Hoje acordei e, definitivamente, decidi tornar-me num bom educador, tornando a palavra brincar uma realidade na sala e fora dela, valorizando cada aprendizagem, cada envolvência, cada relação estabelecida nesse momento tão rico e que nem sempre o valorizo, o brincar. Acordei, mesmo, disposto a tornar estas brincadeiras como uma excelente ferramenta a aproveitar para permitir que subam mais degraus do conhecimento que aqueles a que se propõem, para que assim, se aventurem a trepar mais alto as aduelas de uma porta, a trepar as árvores, a fazer corridas mais velozes, construções utópicas,... porque tudo isso tem uma justificação pedagógica,.. Tem, se eu estiver acordado!

Mas hoje sim, acordei com esta vontade: tornar-me num melhor Educador de Infância, porque se não pensar assim, continuarei estagnado na minha sala e sem abrir portas a outros, ou simplesmente a quem me acompanha. Continuarei adormecido e sem desafios, sem os escutar e sem tornar a educação de infância de qualidade uma realidade. 

Acordei de um sonho em que era o melhor Educador de Infância, e todos os dias as crianças que me acompanham desafiam-me a sê-lo. 

Acordei porque este desejo é a educação de infância. Acordei, simplesmente, porque quero ser um bom Educador de Infância, e como iniciei, termino, que sorte tenho de ser Educador.

#umacaixacheiadenada

Rui

Comentários

  1. E no final do dia?
    Conseguiste ser o educador que ambicionaste no teu sonho?
    As crianças que te são confiadas têm muita sorte.

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    1. Chego cansado, mas dei tudo para ser o educador que ambiciono, sei que a cada dia que passa me dou aos mais pequenos com um intuito apenas, permitir que tenha. Uma educação de infância de qualidade! E todos os dias acordo e tento ser melhor do que no dia anterior! ;) Obrigado pelo teu comentário! :)

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  2. São os abraços, os beijos e os desafios para brincar que nos devem orientar. Eu oriento-me assim, o resto é muito falível. Nem sempre consigo orientar-me pelos superiores interesses das crianças, porque é preciso tempo e alguma organização em grupo para que todos se tornem visíveis. Mas tento. E todos os dias, como tu, tento ser melhor educadora que no dia anterior.

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    1. Isso é o que me orienta também. Penso da mesma forma, o tempo e a organização estão interligados e para dar as respostas que precisam, temos de os ter envolvidos, visíveis, como dizes. Mas a premissa é esta, ser melhor! :) Obrigado pelo teu comentário, beijinho

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